Tamar: Dar a César o que é de César


Já percebeu como nós temos a tendência de culpar outros pelos nossos problemas? Como é difícil para nós analisar uma situação de maneira imparcial e reconhecer que a culpa não está em outras pessoas, mas em nós mesmos? Pois é, Tamar foi vítima disso.

Antes de conhecermos mais sobre a história dessa mulher, precisamos entender o contexto em que ela estava inserida. Judá (um dos descendentes dos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó) foi o futuro sogro de Tamar. Ele se separou de sua família de sangue e foi viver em outro lugar, onde casou-se e teve três filhos. O mais velho, Er, foi quem tomou Tamar por esposa. No entanto, Er era um homem muito mau. Tendo isso em vista, os sofrimentos de Tamar devem ter sido incontáveis pelo período em que ficou casada. Até que seu marido veio a falecer, sem lhe deixar descendentes.


A VIUVEZ

Sem segurança e assistência social, sem lares pobres ou casas de repouso para idosos... uma mulher viúva dependia de seus filhos para apoiá-la e cuidar dela na velhice.

Naquela época, uma viúva sem sucessores teria sérios problemas na vida. Ela estaria condenada à mendicância após a morte de seus pais, pois o marido era responsável pelo sustento e o filho, pela garantia da herança. Após a morte de seu esposo, Tamar lutou pelo seu “direito de ter um filho” e sobretudo garantir a memória de seu falecido marido, em ter o seu nome preservado através de um descendente. Assim, em tais situações, era dever do cunhado por lei perpetuar a linhagem de seu irmão falecido e a também prover o sustento da viúva.

Foi então que seu sogro Judá deu o seu filho do meio, Onã, para arcar com essa responsabilidade. Onã, porém, agiu com mesquinhez - provavelmente ele não queria ter que dividir sua herança com o filho que nasceria da cunhada e talvez porque queria continuar mantendo relações. Ele usou de um artifício para não engravidar a cunhada, derramando o sêmen na terra. Tal atitude injusta foi terrível perante o Senhor, que consequentemente fez com que ele também viesse morrer.

Judá então ficou com um só filho, ainda muito novo. Temendo que ele fosse morto como seus irmãos, pediu que Tamar voltasse à casa de seus pais e mantivesse seu estado de viuvez até que Selá crescesse. No entanto, ele já tinha em seu coração que não o entregaria a Tamar, pois ele achava que de alguma forma Tamar era a responsável pela morte de seus dois filhos mais velhos. E é aqui que vemos o coração corrompido de Judá: ao invés de assumir a responsabilidade da má criação de seus filhos que os levou a serem homens perversos, ele acusa Tamar de ser o motivo da morte deles e, com medo que Selá talvez morresse caso se casasse com ela, ele condena Tamar a uma vida sem esperança.

Ao mandar que Tamar volte à casa de seu pai, sem intenções de recebê-la de volta em sua casa, Judá mata todas as possibilidades de futuro da moça. Ainda “prometida” à família dele, ela não poderia casar-se novamente e sem o casamento com o filho mais novo ela ficava impedida de seguir com sua vida. Conforme os anos passassem, Tamar não poderia mais gerar e assim ficaria fadada a uma vida sem amparo.

Como Tamar, quantas vezes contemplamos um futuro sem esperança, talvez, tirado de nós pela maldade de outros? Quantas de nós fomos abusadas, usadas ou desprezadas por seus maridos ou pessoas cruéis? Quantas deixadas à mercê da vida, sem auxílio ou compaixão? Essa história representa a realidade de muitas mulheres ainda hoje.

A ESTRATÉGIA

Tamar tinha direitos, e não abriu mão deles. Surgiu-lhe então a ideia de ter um filho diretamente de Judá, sem esperar mais que o caçula crescesse. Conhecendo os hábitos do sogro, ela colocou em prática uma estratégia ousada: se fez passar por uma prostituta cultual. As prostitutas cultuais eram usadas nos cultos de fertilidade no Oriente Médio, com o rosto coberto.

Tamar havia pensado em todos os detalhes: Ela sabia que a sua vida estaria completamente em risco quando sua barriga começasse a crescer, e como não havia exame de DNA na época, ela precisaria provar quem era o pai da criança, sem deixar sombra de dúvida. Como ela havia calculado, Judá a cobiçou (lembrando que ele não sabia de quem se tratava, pois ela estava coberta), oferecendo um cabrito em troca dos seus serviços. Mas ela exigiu uma garantia maior, e sugeriu que lhe entregasse o seu selo, cordão e o cajado. Foi então que, por fim, quase 3 meses depois, Tamar apareceu grávida e alguém imediatamente correu para levar a notícia a Judá, dizendo: “Tamar, tua nora, adulterou, e eis que está grávida do adultério…” Então disse Judá: “Tirai-a fora para que seja queimada…”

Em nenhum momento eles se propuseram a interceder por Tamar, mas estavam apenas interessados em criticar, acusar, caluniar e não em ajudar. Esta cena se repete e muito nos dias atuais: Muitas pessoas andam com pedras nas mãos só esperando um boato negativo sobre alguém para logo apedrejar. 

Mesmo diante das calúnias, Tamar sabiamente já tinha garantido seu habeas corpus e logo mandou dizer ao seu sogro: “Do homem de quem são estas coisas eu concebi.” E Judá logo reconheceu os 3 objetos e percebeu que na verdade o errado da história era ele mesmo.

Para a nossa análise, é imprescindível desvencilhar-se da lente moral, própria à nossa sociedade e ao nosso tempo. Os valores socioculturais, à época, eram completamente diversos da nossa, e não servem de exemplo para pautarmos as nossas condutas, hoje, e nem para tecermos críticas aos personagens bíblicos.

Tamar mesmo de forma perigosa, agiu sabiamente segundo a lei da época em que vivia. Não aceitou perder o que era direito seu. O seu exemplo de fé decorre do fato dela dispor da sua vida para proporcionar os meios necessários ao cumprimento de uma promessa. Deus se agradou disso e lhe escolheu para fazer parte da genealogia do Messias junto com outras duas mulheres.

Parecia improvável o Descendente vir da casa de Judá, visto que ele havia se corrompido. Mas, o engajamento de Tamar, uma mulher, com base no credo de uma promessa, foi de suma importância para a benção repousar sobre essa família. Ela foi mãe de dois filhos gêmeos, sendo um deles (Perez) o ascendente de Davi e, por consequência, de Jesus. 

Assim como Tamar: não abra mão daquilo que é seu por direito. Se você recebeu de Deus uma promessa ou até mesmo um sonho, não desista, não pare. Mesmo que a situação esteja bem difícil, mesmo que as pessoas e/ou circunstâncias digam o contrário, que isto é impossível ou não tem mais jeito. Sobretudo se esse propósito tiver como intuito principal glorificar o nome de Deus.

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